Vaticano abre Arquivos Secretos da Segunda Guerra Mundial. Era 11 de fevereiro de 1929 e faltava meia hora para o meio dia quando um Cadillac preto estacionou na frente do Palácio de Latrão, o quartel-general da Cúria Romana.
As portas do carro se abriram e o homem mais temido da Itália saiu: era Benito Mussolini, chefe do regime fascista que governava o país.
Dentro do palácio, o papa Pio XI e seu Secretário de Estado, cardeal Pietro Gasparri, aguardavam.
Por volta das 13h da tarde, Mussolini assinou o Tratado de Latrão, que conferia ao papa um território independente e soberano dentro de Roma.
Em troca, a Igreja Católica jurava manter neutralidade eterna em termos políticos, atuando apenas como mediadora em assuntos internacionais, mas somente quando fosse solicitada.
A rigor, foi nesse soturno dia de inverno, enquanto nascia oficialmente o Estado do Vaticano como ele é hoje – o menor país independente do mundo.
E a última monarquia absolutista da Europa – que a Igreja Católica e o papa se excluíam oficialmente.
E definitivamente do cenário político na Europa, fator que, nos próximos anos, deixaria uma mancha indelével na história do papado e um questionamento até hoje não respondido:
-diante dos horrores da Segunda Guerra Mundial, a Igreja Católica fez o suficiente?
Vaticano abre Arquivos Secretos da Segunda Guerra Mundial
E os detalhes até então nunca revelados da história de um tempo tão dramático, triste e conflituoso, como foi o período compreendido de 1939 a 1945.
Correspondente à eclosão da Segunda Guerra Mundial, começam a ser revelados hoje pelo Vaticano.
Estava marcado para este 02 de março a abertura oficial, para pesquisadores e historiadores, dos arquivos secretos da Igreja Católica referentes ao pontificado do papa Pio XII.
Que foi acusado de ter sido conivente com nazismo e ter feito vista grossa aos horrores do Holocausto.
Vaticano abre arquivos secretos da época da Segunda Guerra Mundial
Eugênio Pacelli, o papa Pio XII, que reinou entre os anos de 1939 e 1958, no auge da Segunda Guerra, é uma figura que, até os dias de hoje, divide opiniões.
Muitos se perguntam se a Igreja Católica, sob o seu comando, poderia ter feito mais para salvar milhares de pessoas martirizadas pelo Terceiro Reich de Hitler.
Quando ainda era Cardeal e um influente diplomata do Vaticano baseado na Alemanha, em 1933, Pacelli foi o arquiteto de um pacto entre a Santa Sé e o governo alemão.
Nominada Reichskonkordat (Concordata com o Reich), que garantia a liberdade e os direitos da Igreja Católica de atuar na Alemanha nazista.
Em contrapartida, mais uma vez, o Vaticano concordava em se abster das discussões políticas na Europa, exatamente em um momento onde a oposição aos regimes ditatoriais que surgiam no continente era mais urgente do que nunca.
E à medida que a década de 30 chega ao fim, a ditadura imposta por Hitler se tornava cada vez mais violenta.
Apesar dos termos do tratado assinado entre a Santa Sé e o governo nazista, padres e bispos católicos continuavam sendo perseguidos, torturados e enviados para campos de trabalho forçado na Alemanha.
Somente em Dachau, ao norte de Munique, acredita-se que pelo menos três mil religiosos foram mortos pelos exércitos do Führer.
Àquela altura, já estava claro que seria impossível confiar no regime de Hitler, e a Santa Sé escrevera mais de 50 reclamações oficiais a respeito das violações da Concordata.
Porém o Vaticano permaneceu calado e sem se manifestar publicamente contra o nazismo.
Tanto Pio XI com seu sucessor, Eugênio Pacelli, o futuro papa Pio XII, exibiram poucas – e bem tímidas – manifestações contra os regimes que banhavam de sangue o continente Europeu.
E quando o fizeram, jamais pronunciaram as palavras “nazista” e “judeu”.
Na encíclica “Mit brennender Sorge” (Com ardente preocupação), de 1937, Pio XI condenava o racismo de forma geral, sob uma perspectiva teológica, mas falhava em citar Hitler e o anti-semitismo.
Da mesma forma, na famosa homilia de 1942, foi a vez de Pio XII se abster e fazer apenas uma discreta alusão a “centenas de milhares de pessoas que, sem qualquer culpa pessoal.
Às vezes por motivo de nacionalidade ou raça, estão marcadas para a morte ou a extinção gradativa”.
Apesar de muitos ainda se questionarem, não o que a Igreja fez, mas o que ela deveria ter feito diante do Holocausto, há quem defenda que não se pode confundir silêncio com omissão.
Roma
Em Roma, por ordens do Vaticano, 155 conventos e mosteiros abrigaram cerca de 5 mil judeus durante a ocupação da cidade pelo regime nazista, em 1943.
E 3 mil se refugiaram em Castel Gandolfo, a residência de verão dos papas.
Pio XII teria evitado, assim, que milhares fossem deportados para campos de concentração, e sua postura teria sido a mais correta e prudente diante das circunstâncias.
Já que uma condenação pública mais forte teria provocado represálias nazistas contra o clero e colocaria em risco milhares de judeus escondidos em conventos da Itália.
Santa Sé,
Segundo a Santa Sé, a abertura da documentação vai provar exatamente isso, que o cauteloso papa italiano, mesmo confinado atrás dos muros vaticanos.
Primeiro pelos nazistas e depois pelos fascistas italianos, na verdade ajudou os judeus durante a guerra, através de uma discreta diplomacia.
Sobre o período do Holocausto, o Vaticano já publicou o essencial há 40 anos, em 11 volumes compilados pelos jesuítas. Mas faltam peças, especialmente no que diz respeito às respostas emitidas por Pio XII.
Documento
Quando o papa recebe um documento sobre os campos de concentração, por exemplo, já revelado nos volumes dos jesuítas, não há a resposta. Ou ela não existe ou está no Vaticano
A verdade é que, nos tempos modernos, papas como João Paulo II e Francisco redefiniram a instituição do papado ao abrirem as portas do Vaticano para o mundo.
Transformando o Bispo de Roma em uma figura presente na vida e no dia a dia dos fiéis, e não mais naquele príncipe distante, enclausurado atrás dos muros da Cidade Eterna.
Ambos, ao seu modo, ajudaram a colocar a Igreja Católica de volta no tabuleiro político internacional.
A história, talvez, nunca entre em consenso a respeito daqueles que o antecederam, mas é indiscutível que, tanto Pio XI como Pio XII, deixaram para os seus sucessores ao mesmo tempo um legado e um questionamento.
Cuja resposta é vital para a sobrevivência da Igreja: como exercer o papel de um líder espiritual em um mundo cada vez mais atormentado por problemas seculares?
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